Jornal do Voto-E

Recorte do Jornal     A Tribuna da Imprensa
Rio de janeiro, 27 de abril de 2001

Muito pior seria se fosse no ano que vem
Carlos Chagas - de Brasília

O Brasil, o dia seguinte sempre consegue ficar um pouquinho pior do que a véspera. Essa conclusão é de mestre Helio Fernandes, feita há muitas décadas. Continua plenamente válida. Só que agora a ameaça é de ficar muito pior. O escândalo do painel eletrônico de votações no Senado será brincadeira de criança, oração de freirinha devota, diante do que pode vir por aí.
Se um simples programa de votações secretas no Senado, num só computador, consegue ser violado com facilidade, o que se dirá do sistema nacional de votações eletrônicas gerais? Claro que a Justiça Eleitoral, responsável pela implantação do sistema, entra na história como nós, de anjo. Não se exigirá dos ministros diploma de técnico em computação. Assim, resta-lhes confiar na alegada inviolabilidade do sistema.

Voto eletrônico sob desconfiança

O problema está em que uma portaria do Tribunal Superior Eleitoral, de 31 de junho do ano passado, número 142/00, ao determinar que a totalidade dos programas não fosse entregue aos partidos políticos, como solicitara o PDT, citou especificamente o "bloco de segurança" que impediria qualquer violação. Só que tem um imenso rabo do lado de fora. Quem preparou esse bloco de segurança? O Cepesc. E em que estrutura se integra o Cepesc? Na Abin. E o que é a Abin? O antigo SNI...
Longe de nós supor qualquer relação entre o passado e o presente, ou seja, o general Alberto Cardoso nada tem a ver com os Golberys, Garrastazus, Fontouras, Figueiredos e Medeiros que durante duas décadas fizeram do SNI um governo dentro do governo, valhacouto do Grande Irmão que tudo dirigia. As coisas mudaram, a partir do general Ivan de Souza Mendes, e o SNI até mudou de nome, tendo implodidas suas antigas finalidades, métodos e áreas de atuação.
No entanto, o segredo do programa de votação das eleições gerais do ano que vem está em poder dos órgãos de segurança. Há que lembrar o caso da Proconsult, de 1982. Leonel Brizola estava eleito governador do Rio de Janeiro. Antigos agentes do SNI, de nível graduado, haviam fundado uma empresa que era subsidiária de outra empresa e que, encarregada das apurações pela primeira vez eletrônicas no Rio, inventaram um tal fator delta, inserido nas projeções do resultado final.
Resultado os votos foram sendo mudados e a vitória quase favoreceu Wellington Moreira Franco, certamente outro inocente na novela. Queriam, os detentores do poder oculto, evitar de qualquer maneira a eleição de Brizola. Por pouco não conseguiram, por ter entrado e modificado o programa das apurações. Não fosse um deles haver dado com a língua nos dentes, por ambição, e a crônica do Rio de Janeiro seria diferente.

Brizola foi gatunado pela Proconsult

Vacinado contra esses golpes cibernéticos, em agosto do ano passado, quando Brizola candidatou-se a prefeito do Rio, o PDT entrou com pedido de impugnação das urnas eletrônicas que em outubro seriam utilizadas pelo eleitorado carioca. Foi alegado o não cumprimento do artigo 99 da Lei 9.504, de 1997, que manda a Justiça Eleitoral apresentar os programas das votações eletrônicas para técnicos designados pelos partidos. O TSE negou o pedido, com base na portaria que revela estarem os programas sob a guarda do Cepesc. Uma liminar em mandado de segurança foi negada e até hoje o TSE não decidiu a questão.
Não dá para fazer suposições maldosas, de estar sendo preparada uma arrumação nas urnas do ano que vem para favorecer a este ou aquele candidato com um novo fator delta. É óbvio que ninguém na Abin nem no governo pensa nisso. Mas trilionários interesses estarão em jogo na escolha do futuro presidente.
Diante da probabilidade da eleição de um candidato das oposições, capaz de estancar a sangria de nossos recursos e de nossa soberania, setores econômicos globalizantes que transformaram o Brasil no paraíso da especulação financeira farão o possível e o impossível para manter o controle da nação em frangalhos.
Atingir programas de computador, quebrar-lhes a inviolabilidade, revelar e mudar seus resultados é possível, como se viu no caso de um simples painel do Senado. O que dizer de um sistema mil vezes maior, mais complexo e, por isso, muito mais vulnerável?
O senador Roberto Requião apresentou, faz tempo, um projeto complementando o processo eletrônico de votação, obrigando o eleitor a também votar em cédulas recolhidas em urnas comuns.
Volta ao passado, ou garantia da lisura de um pleito onde se jogarão os destinos da nação e os lucros da maior quadrilha jamais formada no universo, dos especuladores multinacionais? Seria bom tomar cuidado, a começar pelo governo, pela Abin e pela Justiça Eleitoral.


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