A menos de um mês da primeira eleição totalmente eletrônica
no País, mais de 100 milhões de pessoas irão votar nas 354 mil urnas espalhadas por todo o
Brasil, nada menos que 5.549 prefeitos e 57.316 vereadores. Porém, ainda não será desta vez
que conseguirão exercer de fato sua cidadania, sem correr o risco de serem vítimas de um mal
que há muito assombra o brasileiro a fraude, de acordo com o técnico em Informática e em
processamento de dados Gilberto Serodio.
Ele acredita que as urnas eletrônicas são passíveis de fraude, uma vez que não foram
desenvolvidos métodos de recontagem de votos, a manipulação das urnas será feita
exclusivamente pelos funcionários do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e, portanto,
não há meios de se fiscalizar a segurança do sistema. Em sua opinião, deveria haver
concorrência pública para a escolha da empresa responsável pela apuração e
fiscalização dos votos, ao invés desta missão ficar a cargo do TSE.
Mesmo depois do encontro promovido pelo Tribunal, no Rio, que teve o objetivo de
esclarecer as dúvidas sobre o processo eleitoral eletrônico, Serodio pondera que não há
tempo hábil para corrigir eventuais distorções, a que estão sujeitas as
votações.
"O pior é que, mesmo já tendo sido apontadas soluções para falhas
que possam vir a ocorrer, não há tempo suficiente para modificar o sistema para o dia 1º de
outubro, de acordo com a proposta apresentada pelo senador Roberto Requião (PMDB)".
Ainda segundo Serodio, além dos sucessivos adiamentos da votação do projeto de lei no
Senado, agora também não dá mais para fabricar o equipamento eleitoral necessário
para tornar a eleição transparente até outubro, embora o País disponha de tecnologia
e profissionais capacitados para produzi-lo.
Serodio destaca que, de acordo com o projeto do senador Roberto Requião, que trata de
modificações na Lei 9.504 - que regulamenta o voto eletrônico -, o número do eleitor
não deveria ser digitado no mesmo ambiente magnético em que ele aciona o voto e que todos
os votos sejam impressos em papel, possibilitando, através de um visor, a conferência pelo
votante (o TSE determina que o eleitor acesse o número de seu título e seu voto na mesma
máquina).
Após a verificação do voto impresso, o eleitor poderia confirmar ou cancelar o voto,
repetindo a operação, caso não estivesse de acordo. Dessa forma, seriam assegurados o
sigilo da votação, a auditagem e fiscalização pelos partidos.
TSE só abre programas após votação
O projeto prevê que 3% das urnas sejam submetidas à conferência, comparando o voto
impresso ao registrado no ambiente eletrônico. Dessa forma, os votos impressos confirmariam
se o software está fraudado ou não.
A descoberta de alguma fraude na conferência possibilita que outras 10 urnas sejam verificadas.
O problema é que a avaliação do conteúdo dos programas instalados nas urnas
só serão disponibilizados aos partidos cinco dias após as eleições por
determinação do TSE - o que abriria uma brecha para a fraude.
Segundo o especialista, o acesso dos partidos às urnas não assegura que o software utilizado
nas eleições apresente garantia contra uma eventual manipulação dos dados.
Não há como saber se o programa analisado seja o mesmo que foi aplicado nas urnas
eletrônicas em 1º de outubro.
Os consultores do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Paulo Nakaya e Oswaldo Catsumi, responsáveis
pelo sistema, garantem que ele é absolutamente seguro, mas suas explicações não
convencem Gilberto Serodio, que é militante do PDT.
Ele afirma que a verificação dos programas depois das eleições é inútil. "É possível criar um
subprograma que desvie votos e que se auto-destrua depois da votação, sem deixar rastros",
explica Serodio.
Embora os partidos possam auditar o programa de totalização, segundo os consultores,
o especialista afirma que essa garantia é insuficiente. "É possível conferir a
totalização pelos boletins impressos de cada urna. Este não é o problema.
O problema é o que se passa dentro da urna. O TSE não nos dá acesso total à
urna para auditá-la, o que já é uma fraude", criticou.
Contradições
Já o engenheiro e assessor do PDT, Amílcar Brunazo Filho, especialista em segurança de
sistemas, reforça as afirmações de Serodio. Ele notou também uma mudança
no discurso dos técnicos do TSE em relação à criptografia - sistema usado para
transformar os dados de urna em símbolos incompreensíveis e, assim, garantir sua inviolabilidade.
Segundo o engenheiro, Nakaya e Catsumi sempre afirmaram que não possuíam os códigos
da criptografia, que é elaborado por um órgão vinculado à Agência Brasileira
de Inteligência (Abin). Contraditórios, os técnicos, agora, afirmam ter esses códigos,
mas alegam que não podem disponibilizá-los para a auditoria dos partidos, por questão de
segurança.
Polêmica
Identificação
O que diz o PDT - Não há garantias sobre o sigilo do voto, já que o
número do título do eleitor é digitado minutos antes e na mesma máquina em que
o eleitor registra seu voto.
O que diz o TSE - O número do título do eleitor é digitado apenas para
habilitar a máquina a receber o voto. Uma vez habilitada, é iniciado outro processo, o de
votação, dissociado do primeiro.
Desvio de votos
PDT - O TSE não permite que os partidos tenham acesso total aos programas
usados, mantendo partes secretas. Dessa forma, não é possível verificar se houve a
inserção de um subprograma que desvie votos de um candidato para outro.
TSE - A urna eletrônica recebe, separadamente, o sistema operacional e os
aplicativos onde estão contidos os números e os nomes dos candidatos. O sistema operacional
vem do TSE (Brasília) e os aplicativos são colocados nos TREs (isto é, de cada Estado).
Como o sistema operacional não tem informações sobre os candidatos, não seria
possível viciá-lo com o objetivo de desviar votos.
Criptografia
PDT - O uso da criptografia para garantir a inviolabilidade dos votos é inútil,
já que é possível proteger os dados com assinatura digital (uma espécie de chave
para acessá-los). O engenheiro Amílcar Brunazo Filho, assessor do PDT, teme que a criptografia
possa ser usada para falsear informações. Além disso, o sistema de criptografia não
foi disponibilizado para os partidos.
TSE - O sistema de segurança usa assinatura digital e a criptografia. Depois que
a urna soma os votos e o boletim é impresso, é feita a criptografia para a transmissão dos
dados para a central de totalização e isto evitaria que um fraudador interferisse na transmissão
para alterar os dados.
Teste da máquina
PDT - As urnas são carregadas por um software para teste. Concluído o teste, a
urna é recarregada com outro software que, teoricamente, deveria ser igual ao primeiro. Mas o TSE
não permite que o segundo software seja auditado, portanto não há garantias sobre sua
integridade.
TSE - O objetivo do teste é verificar as condições mecânicas de
funcionamento da urna. Ou seja, se os votos dados a um candidato estão sendo registrados corretamente.
As condições de segurança da urna contra possíveis fraudes são testadas
internamente pelo TSE, para proteger o sigilo do processo.