Jornal do Voto-E

Recorte do Jornal     A Tribuna
Santos, 05 de Novembro de 2000

Criador das urnas eletrônicas defende
Lucas Tavares

[Página original]

Idealizador das urnas eletrônicas no País, o desembargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina Carlos Prudêncio defende o aperfeiçoamento do sistema de votação por computador. Na visão de Prudêncio, um dos meios de melhorar o modelo é fazer com que o voto não fique gravado somente na memória da máquina, mas também em cédulas de papel.

O novo sistema acabaria com as remotas hipóteses de alteração de resultados no esquema eletrônico de votação. ''Não acredito em possibilidade de fraudes, mas a materialização do voto seria uma garantia a mais para evitar quaisquer dúvidas dos partidos políticos'', explicou o desembargador.

Aos 52 anos, Carlos Prudêncio foi o mentor intelectual do atual voto eletrônico. Em 1989, ele implantou o primeiro terminal de votação por computador em Brusque, no Interior de Santa Catarina.

Na época, aos 41 anos, Prudêncio era juiz da 5ª Seção Eleitoral do Estado, com sede naquele município. A adaptação do computador foi feita com a ajuda do irmão, Roberto Prudêncio, dono de uma empresa de informática.

O modelo do programa de computador usado por Prudêncio é o mesmo adotado hoje pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O sistema é único no mundo.

Máquina de votar

No entanto, a evolução do atual modelo para um esquema de registro do voto eletrônico em papel não é novidade para Prudêncio. Nas eleições municipais de 1992, quando Brusque ainda era pioneira no voto eletrônico, o então juiz eleitoral inventou o que ficou denominado ''máquina de votar'' — uma evolução das urnas de 1988 que permitiam o registro do voto em cédulas papel.

''As primeiras máquinas nossas (nas eleições de 1988 e 1990) eram semelhantes às urnas atuais, mas em 1992 tivemos duas vantagens'', lembra Prudêncio. ''Uma delas é que trabalhamos com urnas ligadas on-line e a outra era a materialização do voto''.

Adotado na seção 145 de Brusque, o modelo de 'materialização' funcionava da seguinte forma: em vez de digitar o número dos candidatos numa tela, os eleitores preenchiam uma cédula que passava por um leitor óptico semelhante ao das casas lotéricas. ''Depois, o eleitor colocava a cédula já 'carimbada' pela máquina numa urna convencional''.

Ao final do pleito, para apressar a apuração, os dados registrados pela máquina eletrônica eram encaminhados a um computador central via telefone. As cédulas de papel ficavam armazenadas na urna convencional para eventual checagem em casos de dúvida.

''O assessor de gabinete do deputado federal José Dirceu (PT-SP) me pediu os dados para elaborar um projeto de lei prevendo a materialização do voto'', informou o desembargador. ''Isso pode vir a ser adotado''.

Sobre o sistema on-line, Prudêncio diz que o modelo de transmissão de dados ainda não foi adotado pelo TSE por motivos de segurança. ''Isso é um passo o futuro, mas deve haver a segurança necessária (para evitar interferência de hackers)''.

Hoje, codificados em criptogramas (caracteres ilegíveis para computadores não habilitados), os dados das urnas são transmitidos a um computador central por meio de disquetes.

Possibilidade de fraude é muito pequena

Apesar de não acreditar na existência de alteração de resultados nas eleições eletrônicas, o desembargador Carlos Prudêncio admite haver uma única possibilidade de fraude no sistema. ‘‘Isso só seria possível se alguém colocasse uma máquina com o mesmo programa do TSE para influenciar o resultado’’, disse o desembargador. ‘‘Mas é muito difícil. As urnas passam por vários testes e são lacradas’’.

Conforme Prudêncio, só a clonagem do programa de computador da Justiça Eleitoral usado nas urnas permitiria fraudes. Para tanto, o fraudador teria que contar com o auxílio de funcionários do TSE e das empresas de informática que fazem os programas, além de clonar várias urnas a ponto de garantir uma margem quantitativa suficiente para uma vitória.

A clonagem do programa seria necessária porque os votos digitados nas urnas são criptografados — ou seja, são escritos em um código só lido pelos computadores do TSE.

Carlos Prudêncio também afasta qualquer possibilidade de hackers ou peritos em informática invadirem o sistema de apuração. ‘‘Estou completamente seguro do modelo usado no País’’, atestou o criador da urna eletrônica.

No domingo passado, durante as votações do segundo turno, a deputada federal Telma de Souza (PT) chegou a insinuar que hackers teriam contribuído com sua derrota na disputa pela Prefeitura. Os hackers não podem agir nas urnas porque elas não estão ligadas à Internet.

Modelo foi usado pela 1a vez em 89

A idéia de transformar a cédula de papel em impulsos eletrônicos surgiu na cabeça do desembargador Carlos Prudêncio em 1978. Dez anos depois, nas eleições municipais de 1988, surgiria a primeira oportunidade de colocá-la em prática em Brusque.

‘‘Mas o desembargador Tycho Brahe Fernandes Neto (então presidente do Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina) disse que eu era um sonhador e não autorizou’’, lembra hoje Prudêncio.

Somente um ano depois, nas primeiras eleições presidenciais após o golpe militar, é que a urna eletrônica de Prudêncio funcionaria em caráter experimental. ‘‘Hoje, ao ver isso no País, me sinto um homem realizado na vida por contribuir para o fim das fraudes eleitorais e para a democracia do meu País’’.

Em 1989, a urna eletrônica nada mais era do que um terminal de computador adaptado. O programa era o mesmo usado hoje pelo TSE.

Na primeira experiência de Brusque, 373 eleitores da 90ª. seção eleitoral da Cidade votaram no computador durante o primeiro turno. No segundo turno, disputado entre Luiz Ignácio Lula da Silva (PT) e Fernando Collor (PRN), 790 eleitores das 84ª. e 90ªseções usaram o esquema — montado pela Alcance Informática, empresa de Roberto Prudêncio, irmão do desembargador.

Em 1990, nas eleições para governador, deputados federais, estaduais e senador, a experiência foi repetida.

Tanto em 90 quanto em 89, Brusque foi a primeira cidade do País a encerrar a apuração dos votos eletronicamente. ‘‘Além das urnas experimentais, fomos os primeiros a usar computadores na apuração’’, lembra Prudêncio. ‘‘Eu fui o primeiro juiz a usar computador para apurar em 1982, na comarca de Juaçaba (oeste de SC)’’.

Nas eleições municipais de 1992, as urnas foram substituídas pelas máquinas de leitura ótica em uma seção da Cidade. No plebiscito sobre a forma e sistema de governo, em 1993, o modelo foi repetido.

Em 1996, quando o TSE definiu usar as urnas nos 46 municípios brasileiros com mais de 200 mil eleitores, Brusque foi incluída como a 47ªcidade. ‘‘Temos cerca de 50 mil eleitores e fomos homenageados’’.


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